terça-feira, 11 de agosto de 2020

O QUARTO CÁLICE (Scott Hahn) – segundo apontamento

No post da semana passada o leitor amigo pode ter ficado bravo já que não esclareci quase nada do livro de Scott Hahn O quarto cálice, mas como eu havia alertado esta sequência de postagens não tem como finalidade reproduzir na íntegra o pensamento do autor, mas apenas compartilhar algumas impressões.

Hahn ao longo de suas pesquisas foi se aprofundando mais e mais na Tradição dos primeiros séculos do cristianismo, chegando após anos de árduos estudos a conversão ao catolicismo. Ao iniciar seus estudos em uma universidade católica, ele decidiu assistir a uma missa para entender a celebração eucarística. Sua intenção era agir como um pesquisador de campo observando pássaros e animais, mas o que ele encontrou foi muito mais. Deixemos ele concluir com suas próprias palavras suas impressões, marcadas pelo espanto e a surpresa mesmo décadas após o fato narrado:

 

“Estaria ali somente como observador, como um acadêmico que empreendia uma investigação histórica. Decidi comparecer a uma das Missas de dia de semana, sabendo que elas atraíam multidões menores que a Missa Dominical. Com minha Bíblia e um caderno, sentei-me no banco de trás da capela da universidade. Estava bem preparado. Tinha tomado todas as precauções. Não estaria mais seguro nem mesmo se houvesse utilizado uma bolha plástica por observatório”.

“No entanto, logo percebi que não estava preparado de forma alguma. O que experimentava ali era uma imersão nas Escrituras – tanto no Antigo como no Novo Testamento. Ao mesmo tempo, não se parecia em nada com um grupo de estudo bíblico. Não se parecia em nada com uma aula. Não havia nada ali que alguém pudesse encarar como entretenimento. Não havia nada que parecesse calculado ou calibrado para estimular minhas emoções”.

“As palavras e o culto eram dirigidos a Deus. Diziam respeito a Ele. As fórmulas rituais eram profundamente trinitárias, como as bençãos e saudações de São Paulo. Quando as pessoas não estavam lendo diretamente da Bíblia, o sacerdote estava pronunciando orações ricas em citações e alusões bíblicas, extraídas livremente do Genesis ao Apocalipse”.

“Do Apocalipse, sobretudo. Quase tudo o que vi na capela lembrava-me desse último livro do cânone. Havia um altar e um clero investido. Havia castiçais dourados. A congregação entoava a canção dos anjos do céu: ‘Santo, Santo, Santo’. E, a todo momento, fazia-se menção de Jesus como ‘o Cordeiro’”.

“O rito da Missa evocava o céu – como se estivéssemos mesmo lá -, e o acontecimento como um todo apresentava certa qualidade pascal. Não se tratava apenas da menção do ‘Cordeiro’, embora isso realmente só fizesse sentido em face da Páscoa de Jesus. A Missa inteira estava repleta de símbolos pascais. Percebi muitos deles naquele primeiro dia e ainda outros à medida que fui retornando à Missa nos dias seguintes”.

“Não pude deixar de concluir que a renovação da aliança celebrada pelos católicos era consistente e contínua (como cumprimento) em relação à renovação da aliança celebrada pelo Israel antigo. Do mesmo modo, era profundamente bíblica e cristocêntrica”[1].

 

Páginas depois Hahn comentou do começo da caminhada de sua esposa no catolicismo, que foi mais demorado e acidentado:

 

“(...) ela também começou a reparar no quão profundamente bíblicos eram os ritos da Igreja Católica. Se se incluírem os Salmos Responsoriais, fazem-se dezessete leituras extensas das Escrituras ao longo da liturgia. Era mais Bíblia do que ela, filha de pastor, jamais havia lido num culto dominical”[2].

 

Hahn descreveu acontecimentos ocorridos mais de três décadas atrás. Como historiador fui habituado a desconfiar de relatos pessoais distantes no tempo. Digo isso porque, infelizmente, a memória é móvel e ao longo do tempo omitimos e acrescentamos detalhes novos a nossas memórias com o uso da imaginação. Essa é uma operação diversas vezes involuntária, outras nem tanto, que levam a nós historiadores de ofício a sempre desconfiar de nossas fontes documentais.

O testemunho de Scott Hahn dói em pessoas como eu que, devido o isolamento social provocado pelo Coronavírus e o impedimento de frequentar missas e sacramentos. Provoca dentro do meu ser o desejo de voltar a prática religiosa o quanto antes. Me vem a mente as palavras do “Catecismo verdinho”, aquele das perguntas e respostas que a certa altura dizia: “basta uma comunhão eucarística perfeita para merecermos o Céu”. Bom, isso foi lá em 1992. De lá pra cá assisti missas calmamente, outras olhando o relógio. Comunguei atento, distraído e, em algumas ocasiões de forma não muito digna, e talvez até indigna, para mais tarde correr pra me confessar.

MEA CULPA, MEA MAXIMA CULPA... Como sou tapado me confessava e, bola pra frente!

 

Pensemos nisso quando, finalmente, conseguirmos assistir a missa completa e presencial, para enfim podermos comungar o verdadeiro sangue e carne de Jesus escondidos sob as espécies do pão e do vinho!



[1] HAHN, Scott. O quarto cálice: desvendando o mistério da Última Ceia e da Cruz. São Paulo: Quadrante, 2020, p. 124-125.

[2] Idem, ibidem, p. 134. Essa informação de que católico lê mais Bíblia que protestante no culto dominical é confirmada por Alex Jones (um pastor pentecostal convertido ao catolicismo) na sua obra Não tem preço.

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