No post da semana passada o leitor amigo pode ter ficado bravo já que não esclareci quase nada do livro de Scott Hahn O quarto cálice, mas como eu havia alertado esta sequência de postagens não tem como finalidade reproduzir na íntegra o pensamento do autor, mas apenas compartilhar algumas impressões.
Hahn ao longo de
suas pesquisas foi se aprofundando mais e mais na Tradição dos primeiros
séculos do cristianismo, chegando após anos de árduos estudos a conversão ao
catolicismo. Ao iniciar seus estudos em uma universidade católica, ele decidiu
assistir a uma missa para entender a celebração eucarística. Sua intenção era
agir como um pesquisador de campo observando pássaros e animais, mas o que ele encontrou
foi muito mais. Deixemos ele concluir com suas próprias palavras suas
impressões, marcadas pelo espanto e a surpresa mesmo décadas após o fato
narrado:
“Estaria ali somente como observador, como um
acadêmico que empreendia uma investigação histórica. Decidi comparecer a uma
das Missas de dia de semana, sabendo que elas atraíam multidões menores que a
Missa Dominical. Com minha Bíblia e um caderno, sentei-me no banco de trás da
capela da universidade. Estava bem preparado. Tinha tomado todas as precauções.
Não estaria mais seguro nem mesmo se houvesse utilizado uma bolha plástica por
observatório”.
“No entanto, logo percebi que não estava preparado de forma
alguma. O que experimentava ali era uma imersão nas Escrituras – tanto no
Antigo como no Novo Testamento. Ao mesmo tempo, não se parecia em nada com um
grupo de estudo bíblico. Não se parecia em nada com uma aula. Não havia nada
ali que alguém pudesse encarar como entretenimento. Não havia nada que
parecesse calculado ou calibrado para estimular minhas emoções”.
“As palavras e o culto eram dirigidos a Deus. Diziam
respeito a Ele. As fórmulas rituais eram profundamente trinitárias, como as
bençãos e saudações de São Paulo. Quando as pessoas não estavam lendo
diretamente da Bíblia, o sacerdote estava pronunciando orações ricas em
citações e alusões bíblicas, extraídas livremente do Genesis ao Apocalipse”.
“Do Apocalipse, sobretudo. Quase tudo o que vi na
capela lembrava-me desse último livro do cânone. Havia um altar e um clero
investido. Havia castiçais dourados. A congregação entoava a canção dos anjos
do céu: ‘Santo, Santo, Santo’. E, a todo momento, fazia-se menção de Jesus como
‘o Cordeiro’”.
“O rito da Missa evocava o céu – como se estivéssemos mesmo
lá -, e o acontecimento como um todo apresentava certa qualidade pascal. Não se
tratava apenas da menção do ‘Cordeiro’, embora isso realmente só fizesse
sentido em face da Páscoa de Jesus. A Missa inteira estava repleta de símbolos pascais.
Percebi muitos deles naquele primeiro dia e ainda outros à medida que fui
retornando à Missa nos dias seguintes”.
“Não pude deixar de concluir que a renovação da
aliança celebrada pelos católicos era consistente e contínua (como cumprimento)
em relação à renovação da aliança celebrada pelo Israel antigo. Do mesmo modo,
era profundamente bíblica e cristocêntrica”[1].
Páginas depois
Hahn comentou do começo da caminhada de sua esposa no catolicismo, que foi mais
demorado e acidentado:
“(...) ela também começou a reparar no quão
profundamente bíblicos eram os ritos da Igreja Católica. Se se incluírem os
Salmos Responsoriais, fazem-se dezessete leituras extensas das Escrituras ao
longo da liturgia. Era mais Bíblia do que ela, filha de pastor, jamais havia
lido num culto dominical”[2].
Hahn descreveu
acontecimentos ocorridos mais de três décadas atrás. Como historiador fui habituado
a desconfiar de relatos pessoais distantes no tempo. Digo isso porque,
infelizmente, a memória é móvel e ao longo do tempo omitimos e acrescentamos
detalhes novos a nossas memórias com o uso da imaginação. Essa é uma operação
diversas vezes involuntária, outras nem tanto, que levam a nós historiadores de
ofício a sempre desconfiar de nossas fontes documentais.
O testemunho de
Scott Hahn dói em pessoas como eu que, devido o isolamento social provocado
pelo Coronavírus e o impedimento de frequentar missas e sacramentos.
Provoca dentro do meu ser o desejo de voltar a prática religiosa o quanto antes.
Me vem a mente as palavras do “Catecismo verdinho”, aquele das perguntas e
respostas que a certa altura dizia: “basta uma comunhão eucarística perfeita
para merecermos o Céu”. Bom, isso foi lá em 1992. De lá pra cá assisti
missas calmamente, outras olhando o relógio. Comunguei atento, distraído e, em
algumas ocasiões de forma não muito digna, e talvez até indigna, para mais
tarde correr pra me confessar.
MEA CULPA, MEA
MAXIMA CULPA... Como sou tapado me confessava e, bola pra frente!
Pensemos nisso
quando, finalmente, conseguirmos assistir a missa completa e presencial, para
enfim podermos comungar o verdadeiro sangue e carne de Jesus escondidos sob as
espécies do pão e do vinho!
[1]
HAHN, Scott. O quarto
cálice: desvendando o mistério da Última Ceia e da Cruz. São Paulo:
Quadrante, 2020, p. 124-125.
[2] Idem, ibidem, p. 134. Essa informação de que católico lê mais Bíblia que
protestante no culto dominical é confirmada por Alex Jones (um pastor
pentecostal convertido ao catolicismo) na sua obra Não tem preço.
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