sexta-feira, 25 de outubro de 2019

AINDA SOBRE EVANGELIZAÇÃO/O CASO PE. DOMINGOS CHOHACHI NAKAMURA


Dias atrás contei a vocês sobre a história da catequista/irmã terciária agostiniana/catequista Santa Madalena de Nagasaki.
Completando as reflexões sobre evangelização dos povos, queria falar um pouco sobre o pe. Domingo Chohachi Nakamura (+1940).
Em fins do séc. XIX o Japão havia se aberto ao comércio com os povos ocidentais, e, como já havia contato no post anterior (Cf.: https://teologiadahistoriabrasil.blogspot.com/2019/10/santa-madalena-de-nagasaki-as-licoes.html), isso também acarretou a entrada de missionários cristãos no arquipélago, evangelização essa que havia sido interrompida no séc. XVII.
Nesse contexto o jovem Nakamura se converte, é batizado e se ordena padre, atuando junto aos "cristãos ocultos" nas Ilhas Goto, um arquipélago isolado onde, após as perseguições do séc. XVII, muitos cristãos se esconderam. E lá o Pe. Nakamura seguiu evangelizando com muito empenho e esforço. 

Aos 58 anos de idade, em uma altura da vida onde muitos com razão já pensam na aposentadoria, o bispo local procurava voluntários para iniciar o trabalho de atendimento espiritual aos imigrantes japoneses que desde 1908 emigravam em levas ao Brasil, mais especificamente ao interior do Estado de São Paulo, mas também norte do Paraná, sul de Minas Gerais e Mato Grosso do Sul. 
Sem pestanejar, Pe. Nakamura seguiu para o Brasil. 
No interior paulista da década de 1920 as distâncias eram imensas: entre uma fazenda e outra dezenas de quilômetros que Pe. Nakamura percorreu a pé, ou de vez em quando, o lombo de uma mula e carregando duas pesadas valises. Uma delas com seus paramentos, hóstias, breviário; e a outra com o altar portátil, os cálices, sanguíneos e demais apetrechos para celebrar missa. Eram os tempos da missa em latim de rito tridentino, logo, a bagagem do Pe. Nakamura era bem pesada!
E lá ia ele. Onde havia japoneses ele ia atrás: pregando, batizando, casando e enterrando, quase sempre em japonês. E não apenas os “cristãos ocultos” que haviam emigrado ao Brasil, mas qualquer um com boa disposição no coração, fossem budistas[1], xintoístas[2] ou simples caboclos das redondezas que viviam sem padre: ele os atendia e os ouvia, quando, onde e como fosse. Antes de ser japonês e padre ele era um discípulo de Jesus Cristo e tinha plena consciência de que haviam muitas ovelhas que não eram do seu aprisco – os imigrantes – mas ele atendia qualquer um.
De um paroquiano recém convertido ele certa vez ouviu: “ser cristão é viver o verdadeiro espírito de Yamato!”. Yamato era o antigo nome do Japão. Com o tempo passou a denominar uma província densamente arborizada, onde se dizia, as almas iam morar após a morte. Yamato, de um modo mais genérico, pode também significar tudo o que se refere ao “ser japonês”: sua língua, cultura, costumes. Daí a fala do recém-batizado poder ser entendida como uma forma de “inculturação” da cultura japonesa ao evangelho. Ser japonês e cristão é ser plenamente nipônico. Os conceitos de fidelidade ao senhor ou ao superior, transferidas ao Deus Supremo, a obediência aos mandamentos, tudo isso foi transferido ao cristianismo dos japoneses no Brasil.
E assim ele seguiu trabalhando no Brasil até chegar aos 85 anos, quando a idade e o esforço pesaram. Emagrecido e acamado, perguntou pateticamente: “onde foram parar as carnes das minhas pernas?”. Morreu em odor de santidade.
Seus antigos seguidores, anos depois e em sua homenagem, fundaram a PANIB, Pastoral Nipo-Brasileira, que segue suas atividades até os dias atuais.
Quanto a figura do próprio pe. Nakamura, hoje há todo um esforço em abrir seu processo de beatificação. Rezemos para que este verdadeiro missionário seja um dia elevado aos altares! Que assim seja! 

Que Deus todo poderoso suscite vocações missionárias como as do Pe. Nakamura, na Amazônia, no Brasil e pelo mundo todo.
Amém!!!
(Abaixo segue a oração pedindo a intercessão do Pe. Nakamura).




[1] Sidarta Gautama, ou simplesmente Buda, viveu no séc. V antes de Cristo. Fundador do budismo, muito numeroso em fiéis na Ásia.
[2] O Xintoísmo poderia ser definido como culto aos antepassados. No Japão ganhou uma roupagem religiosa, tornando-se a segunda maior religião do Japão, atrás apenas do budismo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.