sexta-feira, 11 de outubro de 2019

Impressões sobre o Sínodo

Desde o dia 06/10/2019 está se realizando em Roma o Sínodo Pan-Amazônico. Se você é cristão e acompanha minimamente as notícias, creio que já está saturado de notícias e análises do sínodo e possivelmente não quer ler mais uma. Acredite: eu te entendo!
Queria apenas deixar aqui registrados alguns fragmentos de pensamentos que me vieram à cabeça desde o domingo, e como é lógico refletem a minha opinião pessoal. Se a leitura não o agradar, peço encarecidamente que não termine excomungando o papa, bispos e quem não pensa como você, ok?

PAPA FRANCISCO E O SÍNODO: HERESIA, HERESIA...?
Essas palavras vieram á público desde que o sínodo foi anunciado em 2018, e mesmo antes. Tenho conversado com alguns amigos cristãos e o sentimento é o mesmo: estamos chegando no fundo do poço. A parusia (a segunda vinda de Jesus Cristo) só pode estar perto. Por todos os lados vemos defecções, traições á doutrina e a palavra de Jesus Cristo. Parece até que seu aviso: "Quando o Filho do Homem vier encontrará fé sobre a terra?" está se realizando na sua plena crueza.
Aqui penso que devo fazer alguns esclarecimentos.
Não sou ingênuo de pensar que a coisa não está ruim. Ela está sim. Os debates no sínodo demonstram isso. Fica no ar uma leitura liberal - em certos momentos excessivamente liberal! - da doutrina cristã.
Sobre o Sínodo, eu lia esta tarde um artigo no portal de notícias Aceprensa: (https://www.aceprensa.com/articles/amazonia-evangelizar-no-discutir-el-celibato/) onde o entrevistado, um dos "padres sinodais" (nome dado aos participantes do sínodo) lembrava que mais que flexibilizar a figura do padre com ordenações de padres casados e mulheres pregando, devíamos repensar como um todo a evangelização dos povos amazônicos, que afinal de contas ainda são povos de missão. O entrevistado vai mais além e diz:
"Pe. Lasarte questionou a razão subjacente que geralmente é dada para ordenar padres não celibatários: suprir a escassez de ministros. Na sua opinião, "a abordagem do problema nesses termos sofre um enorme clericalismo". É concebida "uma Igreja com pouca ou nenhuma proeminência e senso de pertencer aos leigos". Por isso, ele disse: "Tenho a impressão de que você deseja clericalizar os leigos", quando a prioridade é alcançar "uma Igreja de protagonistas, discípulos e missionários batizados". (Grifo meu).
"Por outro lado, "uma visão" funcional "do ministério que não revitaliza toda a comunidade cristã como protagonista da evangelização, mesmo que tenha ordenado pessoas casadas, não resolverá o problema: o compromisso batismal cristão permanecerá o mesmo".
(Amazonia: evangelizar, no discutir el celibato", Portal Aceprensa, 02/10/2019).
A leitura desta entrevista me ajudou muito a entender um dos vários problemas do Sínodo: a metodologia, ou melhor dizendo: como e porque evangelizar?

INCULTURAÇÃO, INTERCULTURALIDADE, ECUMENISMO E DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO... MAIS HERESIAS????
Aqui entramos mais a fundo em uma discussão que certamente escapa ao entendimento da maioria dos católicos brasileiros: as estratégias de evangelização que capacitam os missionários que atuam na Amazônia. Nos anos 2002-2005 eu havia estudado a fundo a temática da Inculturação do Evangelho, termo que vem aparecendo frequentemente nos debates sinodais.
Resumindo muito rapidamente, poderíamos dizer inculturação é o esforço em adaptar a mensagem cristã às diferentes culturas, à luz dos conhecimentos adquiridos das ciências humanas, em especial a sociologia e a antropologia. A Inculturação deveria alertar os missionários a se equipar para compreender melhor as culturas, e não violentá-las nem destruí-las, em contraponto às missões realizadas nos sécs. XVI-XVII nas Américas e a dos sécs. XIX-XX na Ásia e África.
Admito que esses esforços intelectuais em produzir uma missão cristã renovada por parte de bispos, cardeais, teólogos e especialistas da época não respondiam a pergunta essencial: se não devemos tocar nas culturas não cristãs, que papel restou a missão e ao missionário? E, se não estamos mais convictos de possuir a Verdade do Evangelho, porque então o diálogo e a preocupação de se superar as diferenças? Não seria tudo a "mesma coisa"?
Não à toa, nos anos imediatamente posteriores ao Concílio Vaticano II (1962-1965) a crise que abalou o catolicismo também atingiu duramente as ordens religiosas. Congregações cujos carismas eram a conversão de judeus, muçulmanos, aborígenes e ateus repentinamente se viram alvos de acusações de aculturar (trocar uma cultura inferior por outra superior) povos e nações. Muitas a partir de então entraram em crise. Outras, como os Frades Franciscanos da Reconciliação (cujo carisma era a conversão dos protestantes) mudaram radicalmente e adotaram o ecumenismo como norma de ação.
Aqui penso que a teologia pluralista planetária libertadora, ao equiparar todas as religiões entre si, prestou um desserviço á própria religião, pois a desarmou do seu ser: o de revelar o divino ao humano. E essa teologia pluralista planetária libertadora, ensinada em diversos cursos de ciências da religião, é a teologia que norteia a ação de vários bispos sinodais amazônicos.
Quando Youtubers como Bernardo Küster e Olavo de Carvalho acusam os bispos sinodais de esquerdismo, heresia e nova-ordem mundismo, deveriam acrescentar que existe também esse componente: as ciências humanas há tempos se colocaram acima da teologia, chegando a definir o que é certo ou errado, o que é merecedor do status permanente - dogmático num sentido geral - e não deveria ser tocado nem discutido. O "ser teológico" perdeu seu espaço por direito.
Por outro lado, o aspecto provisório e mutável dos conhecimentos nas ciências humanas foi deixado de lado e formou-se um novo dogma. Se a missiologia e a catequese devem, a partir de agora, seguir de perto as conclusões dos cientistas sociais, o aspecto carismático e educativo da missão fica engessado perante as conclusões prévias estabelecidas pela metodologia e filosofia previamente adotadas. Se sair do "script", não serve! Enquanto em nome da metodologia missionária os debates sobre ordenação de mulheres, padres casados, missas indígenas e outros gastam o precioso tempo dos bispos sinodais, nas matas e florestas da Amazônia legal e real cristãos leigos seguem desatendidos pelos representantes docentes de sua Igreja!
A inculturação do evangelho, na realidade, se processa de maneira muito mais lenta e por "tentativa e erro". Joseph Lortz na sua obra monumental "História de la Iglesia" nos alertou disso no volume I de sua obra. A evangelização dos germânicos no norte da Europa, segundo Lortz, um processo que levou séculos e consumiu gerações de missionários.
Lortz nos alerta que a inculturação do evangelho em uma cultura não pode ser esboçada nos gabinetes dos estudiosos, mas sim "no campo": na ação missionária propriamente dita, ao se pregar a fé verdadeira aos catecúmenos.

PARA FINS DE CONCLUSÃO
Haveria mais coisas a se dizer, mas como o sínodo está em pleno andamento penso melhor parar por aqui e aguardarmos os andamentos dos trabalhos. Mas já arrisco dizer que o Sínodo da Amazônia pode representar um divisor de águas entre uma eclesiologia calcada na "opção preferencial pelos pobres", modelo adotado a partir dos anos sessenta do séc. XX e cujo expoente maior foi a Teologia da Libertação de inspiração marxista; e uma eclesiologia nova, calcada na Tradição da Igreja e renovada pelos desafios deste séc. XXI que mal começou.
Quem viver, verá!

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