domingo, 20 de outubro de 2019

SANTA MADALENA DE NAGASAKI: as lições que devemos tirar – e seguir!


Estava eu na paróquia de NSA da Saúde aqui do lado de onde moro quando ouvi frei Benjamim, o celebrante da missa das 10:00hs da manhã, chamando a atenção de todos para uma pequena imagem que se encontrava perto do altar. Como eu tenho o costume de me sentar longe não percebi muito bem os detalhes, mas logo o frei nos avisou que se tratava de santa Madalena de Nagasaki (1611-1634), padroeira da Fraternidade Secular Agostiniana Recoleta e mártir japonesa. Mas, quem foi essa santa?
Para responder satisfatoriamente a essa pergunta, remeto o leitor a seguinte página na internet: http://arquisp.org.br/liturgia/santo-do-dia/santa-madalena-de-nagasaki , onde a vida dela aparece com mais detalhes. Aqui pretendo me fixar em apenas alguns aspectos de sua vida que me vieram a mente e podem nos ajudar a entender e a agir neste momento crucial da história.


Em começos do séc. XVI um navio português jogado por uma tempestade atracou no Japão. Com a consequente abertura ao comércio vieram os missionários. Aqui o pioneirismo coube a São Francisco Xavier (1506-1552), que plantou as sementes da evangelização.
Mas a situação política japonesa logo iria atrapalhar os planos dos evangelizadores: na época o Japão buscava superar o século anterior de Guerras Civis (sécs. XV-XVI) e uma série de governantes do período unificou o país: Oda Nobunaga (1534-1582), Toyotomi Hideyoshi (1537-1598), e o primeiro Xogum, Tokugawa Ieyasu (1543-1616).
Esses homens eram todos samurais e não viam com bons olhos a evangelização dos cristãos. A tolerância relativa, que ainda existia até fins do séc. XVI, logo cederia lugar a perseguição mais ou menos aberta com o cristianismo sendo visto como “religião dos bárbaros do ocidente”. A proibição de entrada de missionários e a perseguição aos cristãos (kirishitan) provocou a formação de um cristianismo essencialmente laical no arquipélago, em especial na região de Nagasaki.


Aqui se contextualiza a vida de Santa Madalena de Nagasaki. Catequista, apoiava a ação clandestina de padres missionários e levava conforto material e espiritual aos cristãos que se abrigavam nas montanhas ao redor.
Os martírios de cristãos eram executados com requintes de crueldade: enfiar espetos debaixo das unhas e obrigar os supliciados a escavar a terra; mergulhar o prisioneiro de cabeça pra baixo em fossas sépticas (fossas sanitárias); cozinhar vivos os cristãos em termas naturais. O saldo final: morreram tantos mártires no Japão quanto nos períodos de perseguição no Império Romano.
Santa Madalena de Nagasaki foi martirizada no ano de 1634 – ela contava com apenas 23 anos de idade, mas seu exemplo e o de outros inspirou os cristãos a resistirem. De boca em boca, no escondido das cabanas se dizia que um dia os padres voltariam, e para saber se não estariam diante de impostores eles deveriam procurar três sinais:
a)      O padre não deveria ter esposa;
b)      O padre deveria ser devoto de Maria Santíssima, Mãe do Céu;
c)      O padre deveria ser fiel ao Papa de Roma.
Nascia uma Igreja cristã leiga clandestina: os Kakure Kirishitan 隠れキリシタン (cristão escondido). Cedo as autoridades japonesas se deram conta que não seria fácil dobrar os cristãos japoneses e além da tortura, exílio e execução procurou-se, através de cerimônias blasfemas fazer os cristãos renegarem sua fé: o fumiê, que consistia em obrigar o acusado de cristianismo a pisar ou despejar seus excrementos sobre uma imagem de Jesus e/ou Maria Santíssima. Quem se negasse a fazê-lo era torturado e morto[1]. O cristianismo japonês só voltaria a “ter padre” em fins do séc. XIX com a reabertura do Japão ao ocidente e o final do xogunato Tokugawa.
Mas isso não significou o fim das dores: mesmo sob o governo do Imperador Meiji – pró-ocidente e aberto a modernização do país - houve novas perseguições. Por fim a explosão e destruição da catedral de Nagasaki pela bomba atômica em 09 de agosto de 1945 forçou a secular comunidade de Nagasaki a mais uma vez se reerguer das cinzas.


Hoje o cristianismo representa menos de 10% da população japonesa, sendo que apenas 3% se reconhecem católicos. Ou seja, o Japão moderno ainda é terra de missão.
Mas... e o que isso tem a ver conosco aqui no ocidente?
Ora, simplesmente tudo!
Quando se discute a maciça falta de padres na Amazônia, o exemplo dos cristãos ocultos que mantiveram sua fé por 250 anos seguidos nos ensina que capacitar os leigos para serem transmissores da fé é um meio útil, prático e seguro. E a vida de Santa Madalena de Nagasaki nos ensina que o melhor pregador num contexto de total ausência de padres é a santidade de vida, o amor à Igreja e aos sacramentos (ou mesmo a falta deles).
Esta, meus amigos, é a hora dos leigos. Não somos longa manus (mãos longas) dos sacerdotes, apêndices ou fiéis de segunda categoria, mas membros ativos da Igreja de Cristo, com o mesmo múnus de pregar, santificar e ensinar. Essa doutrina, ratificada pelo Concílio Vaticano II como “sacerdócio” dos fiéis leigos é a saída para que, de uma igreja esmagadoramente laical, surjam enfim vocações religiosas para pular o “muro sacramental” que a falta de padres provoca[2] nas comunidades.

Pensemos em tudo isso!!!!![3]
Boa noite e tenham todos uma excelente semana!!!!!!!
Santa Madalena de Nagasaki, rogai por nós, pelo Papa Francisco, pelos padres-sinodais e por toda a Igreja de Cristo!!!!!!!!

Edison Minami.



[1] Essa cena, chocante para um católico, foi magistralmente descrita em uma das aventuras do Lobo Solitário, mangá famoso dos anos 1970, já publicada no Brasil pela editora Panini Comics.
[2] A expressão “muro sacramental” era usada por São Josemaría Escrivá para explicar que, mesmo na Prelazia Pessoal do Opus Dei onde se cultiva a santificação dos fiéis leigos no meio do mundo através de suas atividades cotidianas, a recepção dos sacramentos depende da existência de padres e bispos.
[3] Para saber mais, recomendo: John Whitney-Hall. História universal, vol. 20: o Império Japonês. Ed. Siglo Veinteuno, México-DF, 1973; José Miguel Cejas. Os crisântemos em flor. Quadrante, 2019; Paul Glinn. Um hino a Nagasaki. Loyola, 1992.

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