Sim, sim; eu
também estou escrevendo de dentro da minha casa, de onde não pretendo botar a
cara para fora pelos próximos dias, somente pra comprar comida, medicamentos e
só.
Confesso que há
anos perdi muito dessa vontade de ficar de bobeira na rua, ou mesmo na TV e
internet. Se saio, tem que ter alguma finalidade: realizar tarefas, encontrar amigos,
ou me distrair com alguma atividade sadia. Sair sem nenhuma finalidade, nem
pensar! E como eu tenho dois idosos para cuidar aqui, mesmo esses momentos de
distração rarearam, como não poderia ser diferente.
Ruim? Bom, não
vou dizer que essa era a vida que eu sonhava. A realidade superou até mesmo os
meus sonhos mais loucos, como está sendo para todos. Mas queria deixar
registradas algumas impressões sobre a pandemia que paralisou o mundo, e talvez
apontar algumas luzes no fim do túnel.
Dois livros que
li podem nos ajudar a compreender como enfrentar essa provação do recolhimento
forçado. O primeiro é um testemunho do padre Walter J. Ciszek (Cf.: https://www.quadrante.com.br/pelos-vales-escuros),
um jesuíta que passou 23 anos preso em campos de confinamento na URSS. O outro,
o do cardeal François X. N. Van Thuan (Cf.: https://www.cidadenova.org.br/livraria/produtos/30-testemunhas_da_esperança),
que passou anos em uma solitária, também preso por um regime de inspiração
marxista.
O que ambos possuíam
em comum? Uma resiliência perante situações desconcertantes, privação completa
e absoluta de liberdade. Sem banho, sem comida, sem receber visitas, constantemente
ameaçados de fuzilamento. Só restava a eles aceitar a realidade.
Aqui é preciso
uma breve explicação: para nós, cristãos, a aceitação da realidade é o começo
da entrega completa a Vontade de Deus. Para nós, Deus não é um ser distante e
frio, mas um Deus de misericórdia e bondade que só quer o nosso bem. No caso do
Pe. Cisbek ele mesmo chega a dizer no livro que a parte mais difícil da privação
para um cristão é saber que nada pode mais ser feito. Você não tem espaço de
manobra para dizer: “fiz a minha parte e que agora Deus faça a sua”. Não! Não
há nada a se fazer. Esse sacrifício da nossa vontade e inteligência (entendimento)
é um processo muito doloroso, porém necessário, porque rompe as últimas amarras
que nos impedem de aceitar a Vontade Dele. Nada de mal vem de Deus. A dor nos
purifica e nos permite ver a Deus sem obstáculos.
Alguém que teve
coragem de ler este texto até aqui pode me criticar dizendo: ok, mas... e aí? Vamos
nos entregar ao pessimismo então?
Nada disso! A mensagem
do Pe. Cisbek e do Cardeal Van Thuan são de otimismo. Otimismo em ver que,
mesmo diante das maiores calamidades, Deus nos acompanha e de um grande mal pode
tirar um grande bem. Basta que permitamos, que usemos bem da nossa liberdade,
do nosso livre arbítrio para realizarmos o plano divino que Ele desenhou desde
toda a eternidade. Podes crer que tu vais sair dessa quarentena forçada – que,
admitamos, é bem mais suave que uma solitária numa prisão vietnamita! – mais purificado
na sua alma, mais leve, mais atencioso aos seus parentes, amigos e colegas de trabalho.
Verá que o valor de um sorriso no rosto de uma criança, em um idoso, entre um
homem e uma mulher é inestimável, vale bem mais que um milhão de dólares.
Por fim, queria
terminar minhas reflexões comentando de outro padre: José Emerson Barros Cabral
(Cf.: https://www.youtube.com/user/peemersondf/videos).
Ele celebra diariamente missa em sua capela particular. Por causa da pandemia? Não.
Na verdade, ele já vivia em quarentena há tempos, devido a um transplante de
rim realizados meses atrás. Sim, ele faz parte do tal “grupo de risco”, mas segue
vivendo um dia após o outro, como aliás todos nós deveríamos fazer. “O pão
nosso de cada dia nos daí hoje”, nos pediu Jesus que pedíssemos ao Pai Celeste.
Ele não nos ensinou a pedir o pão de amanhã, ou da semana que vem, ou em
estocar a “quentinha” como alguns egoisticamente fizeram com itens de higiene
pessoal nas últimas semanas.
Viver um dia
após o outro, fazer o que temos e podemos fazer como se tudo dependesse de nós,
e rezar intensamente porque tudo depende Dele: eis a fórmula, penso eu, de como
vamos superar essa que possivelmente será a maior crise deste começo de século XXI.
Despeço-me,
agradeço a paciência que você teve em ler estas linhas meio improvisadas, e
cuide-se!
Edison Minami.
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